Cada um sabe a delícia e a dor de ser… ME ou EPP em Recuperação Judicial
Geradoras de 27% do PIB nacional, empregadoras de 52% dos brasileiros com carteira assinada, responsável pelo pagamento de 40% dos salários desses brasileiros, e totalizando quase 90% das empresas do Brasil [1], as Microempresas (ME’s) e as Empresas de Pequeno Porte (EPP’s) parecem ter sido deixadas de lado pelo legislador quando da elaboração da Lei de Recuperação Judicial e Falências (Lei 11.101/2005).
Nos parcos três artigos destinados à regulação do tema, o legislador, ao mesmo tempo em que conferiu certos benefícios, deixou a desejar no regramento às ME’s e EPP’s. Se, por um lado, o processo de Recuperação Judicial dessas empresas pode ser célere, direto e com menos burocracia e formalidades, por outro, impõe-lhes condições onerosas e o sempre presente risco de decretação de falência.
As grandes dificuldades que as ME’s e EPP’s terão de enfrentar na Recuperação Judicial são: (i) a decretação de falência no caso de rejeição do Plano Especial de Recuperação Judicial por credores detentores de mais da metade dos créditos de quaisquer classes; (ii) a impossibilidade de aumentar despesas – e consequentemente de investir – e contratar novos empregados enquanto durar a Recuperação Judicial, salvo autorização judicial prévia; e (iii) a continuação das ações de execução de créditos extraconcursais (ausência parcial do “stay period”).
Se as ME’s ou EPP’s superarem esses obstáculos, ainda assim se verão obrigadas a seguir algumas condições pré-estabelecidas na lei que, no mínimo, poderiam ter sido melhor consideradas pelo legislador, conferindo maior liberdade às pequenas empresas em crise. São elas: (i) limite de 36 meses para parcelamento da dívida; (ii) obrigatoriedade de iniciar os pagamentos em 180 dias contados do pedido de Recuperação Judicial; e (iii) obrigatoriedade de correção dos débitos pela variação da SELIC. A negociação de deságio é permitida.
Quanto aos bônus: os grandes benefícios concedidos às ME’s ou EPP’s no Processo de Recuperação Judicial são a possibilidade de concessão e aprovação diretas da Recuperação Judicial e do Plano Especial, respectivamente, desde que preenchidos requisitos formais, e a dispensa da realização de Assembleia Geral de Credores, medida onerosa e demorada, com grande potencial inviabilizador da recuperação da empresa.
Vê-se portanto que, mesmo que com sensíveis limitadores e pouca liberdade negocial, a Recuperação Judicial ainda pode ser importante instrumento de superação da crise econômico-financeira pela Microempresa e pela Empresa de Pequeno Porte.
Importante: em recentíssima votação, de 28.02.2018, o Plenário do Senado Federal aprovou o Projeto de Lei 285/2011, que trata especificamente da Recuperação Judicial das ME’s e EPP’s. Esse projeto prevê: (i) dispensa da apresentação de certidão negativa de débitos fiscais para requerimento da Recuperação Judicial; (ii) dilatação do prazo de pagamento de 36 para 48 meses; e (iii) limitação da correção anual das parcelas a 12%, correção essa ainda atrelada à variação da SELIC.
O Projeto de Lei, embora benéfico em linhas gerais, mostra que o legislador perdeu mais uma oportunidade de se aprofundar no tema da Recuperação Judicial das ME’s e EPP’s e lhes conferir maior liberdade de negociação. O projeto, de autoria do Senado, foi encaminhado à Câmara dos Deputados e, se aprovado, será remetido ao Palácio do Planalto para sanção ou veto.
[1] http://www.sebrae.com.br/sites/PortalSebrae/ufs/mt/noticias/micro-e-pequenas-empresas-geram-27-do-pib-do-brasil,ad0fc70646467410VgnVCM2000003c74010aRCRD
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