A polêmica da incidência de ISS sobre atividades-meio e a solução na identificação da atividade-fim

A polêmica da incidência de ISS sobre atividades-meio e a solução na identificação da atividade-fim

Os mais de 5.500 municípios ao redor do País dão motivo a uma das discussões tributárias mais longeva e polêmica: o local de incidência do ISS.

E dentre os debates travados nesse âmbito o mais complexo parece ser aquele a respeito da tributação de serviços que se desenvolvem em etapas, por meio das chamadas atividade-fim e atividades-meio.

O esforço jurisdicional que vem sendo exercido sobre o tema passa muito pela mais moderna interpretação do que se define por  “estabelecimento prestador”, conceito adotado pelo legislador na determinação do aspecto espacial do ISS.

Um precedente de grande relevância nessa matéria foi firmado quando o STJ analisou a incidência do imposto sobre o arrendamento mercantil (leasing financeiro), em cuja operação algumas etapas estão pulverizadas ao longo do território nacional, tal como recepção de documentos, formalização de proposta, assinatura de contrato e entrega do bem, que, porém, não se confundem com a atividade-fim que é a concessão em si do valor financiado.

Segundo o STJ, o núcleo da operação de leasing financeiro – ou seja, o elemento precípuo da obrigação de dar – está nas etapas de aprovação do financiamento e liberação do numerário, como se observa no entendimento daquela Corte:

“Nos casos de Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISSQN) incidente sobre contratos de arrendamento mercantil, a competência para cobrança do tributo é do município em que estabelecida a sede da instituição financeira, onde está o centro decisório sobre o ajuste das cláusulas contratuais e operacionais para todas as suas agências, bem como sobre a aprovação do financiamento e da liberação do numerário correspondente, de modo que pouco importa se são realizados procedimentos acessórios em outros municípios, como a entrega de documentos, a formalização da proposta e até mesmo a entrega do bem”.

Curioso notar que nem mesmo a entrega do bem – que consiste no próprio resultado prático da atividade – é vista como atividade-fim, mas sim aquelas etapas afetas às deliberações sobre análise de risco e disponibilização do valor financiado.

Pois bebendo dessa água, esta Banca de Advogados tem defendido que o mesmo racional se aplica à operação de planos de saúde, na medida em que a prestação possui igualmente diversas etapas preparatórias, auxiliares e consectárias que, embora imprescindíveis, não configuram a atividade-fim das operadoras, esta que, por sua vez, corresponde essencialmente a (i) ajuste de cláusulas contratuais, (ii) análise de cada cobertura  assistencial solicitada e (iii) liberação de recursos para a consecução do atendimento pretendido caso autorizado.

A invocação da tese vem se mostrando importante, pois têm sido comum operações de M&A no setor da saúde suplementar, as quais tendem a resultar na centralização da operação num único local onde se reúne o complexo de bens, tecnologias e pessoas responsáveis pela gestão, o que, pragmaticamente falando, importou em enorme perda de arrecadação em municípios que passaram a abrigar terminais de relacionamento que outrora foram a sede de operação.

E, não por acaso, muitos municípios tem buscado tributar estabelecimentos que eventualmente se tornam meros pontos de suporte ao usuário, com atribuição exclusivamente  de, por exemplo, recepção de documentos, emissão de guias, prestação de informações e agendamento de consultas.

No curso das demandas patrocinadas por esta Banca foi demonstrado, inclusive por meio de perícia, que filiais com mencionadas atribuições não podem ser tidas por unidade econômica-profissional com poderes decisórios suficientes à análise de coberturas contratuais e aprovação da liberação de recursos financeiros tendentes a viabilização do atendimento assistencial, isto é, por aquilo que se entende por estabelecimento prestador e onde se verifica o núcleo da operação de planos de saúde e o próprio fato gerador do ISS.

Sobretudo, a importância da tese se deve principalmente ao fato de ter se revelado exitosa, tendo sido acolhida em julgados de 1º e 2º Grau, muitos já transitados em julgado, com efeito anulatório sobre alguns milhões de reais lançados a título de ISS sobre atividades-meio.

Em suma, pode se dizer que o processo natural de avanço tecnológico, modernização das relações contratuais e otimização de gestão e a própria mudança nas demandas da sociedade e o surgimento de novos modelos de trabalho tendem a ser infinitamente mais velozes que a evolução do direito positivo, motivo pelo qual precedentes como estes acima devem ser celebrados.


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