A incidência do ISS sobre serviços de transporte via aplicativo e o Projeto de Lei do Senado – PLS nº 493/17

A incidência do ISS sobre serviços de transporte via aplicativo e o Projeto de Lei do Senado – PLS nº 493/17

Há tempos a guerra fiscal é capítulo à parte no cenário tributário brasileiro, sendo que a (in)definição do município competente para cobrar o ISS é discussão frequente desse capítulo que parece ser interminável.

Essa disputa tem como principal razão as grandes desigualdades econômicas entre os municípios brasileiros e é acirrada pelo surgimento de novas tecnologias e novos modelos de negócio, que cada vez mais permitem a prestação de serviços de forma remota.

Pois bem, é a Lei Complementar nº 116/2003 que define a competência para cobrança do ISS, que tem como regra o município em que está localizado o estabelecimento prestador como o competente para exigir o imposto sobre a atividade, salvo exceções, que podem definir como município competente aquele onde está localizado o tomador do serviço ou o local da prestação do serviço.

Entretanto, o avanço tecnológico e a criação de novos modelos negociais fez exsurgir no Senado Federal o PLS nº 493/2017, que prevê modificação à LC nº 116/03, de modo a alterar substancialmente a tributação dos aplicativos de serviços de transporte.

O Projeto já aprovado pelo Senado e que agora caminha para Câmara, além de criar um item específico para o serviço[1](transporte privado individual previamente contratado por intermédio de provedor de aplicações da internet), prevê que o ISS deverá ser recolhido ao município do local de embarque do tomador/passageiro, o que difere totalmente do entendimento jurisprudencial até então consagrado pelo STJ.

Por isso, a considerar o histórico da guerra fiscal relativa ao ISS na jurisprudência brasileira, restam dúvidas sobre a aprovação do PLS nº 493/17.

Basta lembrar que, em julgamento[2] submetido à sistemática dos recursos repetitivos, o STJ firmou a tese de que em contratos complexos, caracterizados por diversas prestações realizadas em locais diferentes, como o contrato de leasing, a análise acerca do local em que é desempenhado o serviço deve se ater às atividades que representem o seu “núcleo”.

Nesse cenário, a definição do local da prestação do serviço envolve diversas nuances estabelecidas (existência ou não de unidade econômica ou existência de contratos complexos, com prestações executadas em mais de uma localidade), de modo que a jurisprudência serviu para fomentar diversas situações em que mais de um município passou a reclamar a cobrança de ISS sobre um mesmo fato.

Transportando o entendimento jurisprudencial histórico do STJ para as atividades dos aplicativos da chamada economia colaborativa, há, na verdade, a disponibilização de uma plataforma on-line em que consumidores e prestadores se encontram, sendo que as decisões gerenciais e operacionais, além de toda a estrutura humana necessária para suportar esse “encontro” (núcleo dos serviços), não estão no município de domicílio do tomador (a não ser que haja uma coincidência).

Dadas as características do serviço, seria problemático enxergar a formação de “unidade econômica e profissional” das plataformas nos municípios onde são realizados “somente” os embarques dos tomadores/passageiros, pois os motoristas não possuem vínculo profissional com os aplicativos, podendo ser caracterizados como meros usuários de seus serviços de intermediação.

Logo, uma vez aprovado o PLS nº 493/17, resta saber qual será o posicionamento dos municípios, já que o novo projeto acarretará potencial perda de arrecadação.

Além disso, a aprovação do Projeto colocaria em xeque a consagrada jurisprudência do STJ, tendo em vista que a atividade de intermediação prestada pelos aplicativos é realizada integralmente de forma remota, não havendo elementos de conexão  que autorizem a cobrança no município em que realizado o embarque do tomador/passageiro, tal como pretende o PLS nº 493/17.

Sendo assim, não há dúvidas de que a cobrança de ISS pelos municípios em que localizados “somente” os tomadores/passageiros do serviço — ou seja, em que ausente o estabelecimento prestador — é questionável dos pontos de vista legal e constitucional e tende a provocar disputas judiciais e entraves operacionais à atuação dos aplicativos serviços de transporte.

[1] Item 1.10 da Lista de Serviços: “Agenciamento, organização, intermediação, planejamento e gerenciamento de informações, através de meio eletrônico, de serviços de transporte privado individual previamente contratado por intermédio de provedor de aplicações da internet

[2] REsp 1060210/SC, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/11/2012, DJe 05/03/2013

http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?livre=1060210&repetitivos=REPETITIVOS&&tipo_visualizacao=RESUMO&b=ACOR


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